O Segredo de Isabella Cortese
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O livro I secreti de la signora Isabella Cortese, ne'quali si contengono cose minerali, medicinali, arteficiose, & Alchimiche, & molte de l'arte profumatoria, appartenenti a ogni gran Signora. Con altri bellissimi Secreti aggiunti (I secreti…) foi impresso pela primeira vez no ano de 1561, na cidade de Veneza, tendo como editor Giovanni Bariletto.
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Oficialmente, ele está sob a autoria de Isabella Cortese, mas existem divergências acerca de sua existência entre os estudiosos. Isso porque muitos acreditam que há semelhanças de escrita entre Isabella Cortese e outros autores da época, além de considerarem a publicação de um livro por uma mulher algo improvável para a época. Além disso, com exceção do livro, não há documentos que comprovem a existência de uma Isabella Cortese por volta da época da publicação. Entretanto, há aqueles que discordam dessa visão porque não acreditam que essas semelhanças estilísticas sejam válidas e também não percebem vantagens em publicar sob um nome feminino. Por isso, não podemos afirmar ou não se Isabella Cortese existiu.
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Acredita-se que a obra foi popular em seu período devido às suas 15 edições em italiano, publicadas entre 1561 e 1677, e outras duas em alemão. Parte do motivo de sua popularidade é atribuído justamente ao seu público alvo: mulheres que não necessariamente pertenciam às camadas mais altas da sociedade. Estima-se que esse seja o grupo-alvo devido a três fatores: seu formato em receitas, sua escrita em italiano vulgar e seus objetivos.
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O último motivo está muito relacionado ao gênero segredo, ao qual o livro pertence. Essa variedade de livros surgiu no século XVI devido ao contexto da cultura científica da renascença, que favorecia o empírico. Assim sendo, o segredo não compreende algo desconhecido pela maioria, mas sim algo experimentado e comprovado. Nesse sentido, a literatura dos segredos surge como um agrupamento de receitas medicinais, alquímicas, cosméticas e de diversos outros assuntos. Ainda, entende-se que essas receitas estão ligadas ao desbravamento do oculto da natureza e teriam como fim subjugar e domar esses mistérios naturais.
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Posto isso, fica mais fácil de entender como a obra é estruturada, pois suas receitas são divididas em quatro livros de acordo com suas temáticas. Porém, antes dessas, tem-se elementos como o prefácio dedicado ao Arcediago Mario Chaboga e o índice indicando em qual das quatro partes e página está cada uma das receitas. O primeiro livro tem finalidade medicinal, contendo tratamentos para Peste Bubônica, antídotos, remédios para sífilis, cuidados pós-parto, etc. O segundo possui uma maior ênfase na alquimia, com a produção de ouro e da pedra filosofal. Já o terceiro também tem esse foco na alquimia, mas com receitas destinadas majoritariamente ao cuidado da casa, como cola para madeira, fabricação de espelhos e removedores de manchas. Entretanto, também são encontradas receitas ligadas ao embelezamento, seja de pessoas, seja de objetos. Por fim, o quarto livro é o de escopo cosmético, com receitas como máscaras faciais, perfumes, clareadores de pele, entre outros.
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A obra de Cortese se conecta com o gênero do segredo porque a alquimia e a medicina são unidas por uma visão científica idêntica e pragmática que aproxima a realidade como algo positivo. Assim sendo, os mistérios do universo poderiam ser subjugados e moldados para facilitar a vida do ser humano, sendo essa a função das receitas trazidas no livro. Além disso, a ligação de I secreti… com a alquimia é percebida, principalmente, na forma como as receitas devem ser feitas, pois nelas são utilizados processos, como a destilação, e instrumentos, como o alambique, típicos da prática alquímica.
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Assim sendo, conseguimos ver que I secreti… é um documento com amplas possibilidades de estudo, abraçando temáticas como medicina, alquimia e cosmetologia. Porém, ainda há muito a ser explorado, pois são poucas as pesquisas que tratam da obra.
Referências:
LESAGE, Claire. La littérature des ‘secrets’ et I secreti d’Isabella Cortese. In: Chroniques italiennes. Paris, n. 36, p. 145-178, 1993.
RAY, Meredith K. The Secrets of Isabella Cortese: Practical Alchemy and Women Readers. In: RAY, Meredith K. Daughters of alchemy: women and scientific culture in early modern Italy. Florença: Harvard University Press, 2015. p. 46-72.
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Sobre o autor do verbete:
Isabel Antonello Flores é graduanda de Licenciatura em História na Universidade Federal de Santa Maria e faz parte do Grupo de História Medieval e Renascentista-Virtù.
E-mail: isabel.flores@acad.ufsm.br
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7673326121519351