Papado
O papado é uma instituição político-religiosa cuja figura central é o Papa, o Bispo de Roma, líder da Igreja Católica. As origens do papado remontam aos primórdios do Cristianismo, imediatamente após a morte de Jesus Cristo. De acordo com a tradição cristã, Jesus entregou o futuro da Igreja Cristã nas mãos do Apóstolo Pedro e este teria sido o primeiro papa.
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Com a conversão do Imperador Romano Constantino (272 – 337) ao cristianismo e sua oficialização como religião do Império Romano pelo Imperador Teodósio I (347 – 395) no século IV d. C., o papa viu seu poder e influência crescerem sem precedentes. O papado acabou por herdar muito das antigas instituições romanas, incluindo o ideal do princeps romano, relegado ao imperador e mais alto poder na jurisdição. Esse desejo de dar continuidade às tradições imperiais deu origem inclusive a falsificações, como a Doação de Constantino, que supostamente atribuía ao papa Silvestre I (285 – 335) e seus sucessores longas extensões de terras além de um aparato para cerimoniais.
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Não obstante, a Cúria Romana, o organismo administrativo da Igreja Católica, tornou-se praticamente uma corte imperial, monopolizando o poder de tomar decisões, principalmente políticas. Pode-se dizer também que o poder da Igreja era mais centralizado que os poderes políticos da época, assemelhando-se quase ao das monarquias modernas do século XVI. Essa “monarquia papal” contava com uma organização financeira, que a permitia arrecadar receitas e possuía também um corpo jurídico, onde os cânones eram organizados e julgamentos realizados.
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Com todo esse aparato imperial, era de se esperar um futuro conflito entre o papa e o imperador. Havendo um único Deus, ele haveria enviado apenas um único homem para chefiar a Cristandade. Mas qual desses homens deveria ter o controle da Cristandade: papa ou imperador? Embora os preceitos cristãos fossem ditados pelo papa, o imperador era aquele quem governava todos “em nome de Deus”, tendo sido diretamente investido de poder por Ele.
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Foi a partir deste conflito entre os imperadores e os papas, que teve origem a Reforma Gregoriana (1049 – 1454). Esta reforma pretendia frear a “investidura laica” que vinha ocorrendo dentro da Igreja e conferir ao papa poderes absolutos sobre todas as pessoas. Assim foram estabelecidas a infalibilidade papal (o papa está sempre correto e não deve ser questionado) e a supremacia da Igreja Católica (para que pudesse ser construída uma Igreja centralizada e destinada a uniformizar a Cristandade). Com a consolidação da Reforma, o Império tornou-se “dessacralizado”, enquanto a Igreja voltou a reclamar seu papel de governante única (tanto no plano terreno quanto no plano espiritual).
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Apesar do poder supremo durante o período medieval, a Igreja ainda assim teve que lidar com crises e rompimentos, como o Cisma do Oriente e o Cisma do Ocidente. O Cisma do Oriente ocorreu em 1054 entre a Igreja Ocidental e a Igreja Oriental. As Igrejas estavam separadas desde a divisão do Império Romano. Porém, a partir do século XI, conflitos políticos e discordâncias doutrinais levaram o patriarca de Constantinopla a romper os laços com o Bispo de Roma, dando origem ao cisma. O Cisma do Ocidente ocorreu três séculos mais tarde. O então papa Bonifácio VIII estava em uma disputa com o rei francês Filipe IV. Com a morte do papa, Filipe pressiona para que o novo papa seja um francês. É eleito Clemente V, que é levado quase que a força para a cidade de Avignon. A cidade francesa então se torna a sede do papado. Em 1378, o papa Gregório XI retorna a cidade de Roma e lá falece. Por conta disso, é escolhido em Roma o papa Urbano VI. Porém os franceses também haviam eleito Clemente VII. Para solucionar o impasse, é convocado um concílio em Pisa para eleger um terceiro papa e depor os outros dois. Porém, a disputa não se encerrou e a Igreja se viu com três papas disputando o poder. O papado só é unificado novamente em 1417, com a deposição dos papas de Avignon e Pisa, a renúncia do papa de Roma e a escolha de um novo pontífice.
De qualquer maneira, o papado e a Igreja Católica medievais são reflexos da sociedade da época. Tudo era feito dentro da religião, pensando na religião. Não existia possibilidade de vida fora da esfera da Igreja. Aqueles que tentassem eram rapidamente excluídos da sociedade e impedidos de conviver com os demais. Sendo assim, o papado começou a trabalhar em busca da consolidação de seu poder para que pudesse governar por toda a Cristandade.
Referências:
LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean-Claude. Dicionário Temático do Ocidente Medieval. Vol. 1. São Paulo: EDUSC, 2002.
RUST, Leandro. Colunas vivas de São Pedro: concílios, temporalidades e reforma na história institucional do Papado medieval (1046 – 1215). Tese (doutorado) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2010.
MEYER, Andreas. Papal Monarchy In. LANSING, Carol; ENGLISH, Edward. A companion to the medieval world. Blackwell Publishings, 2009. p. 372 – 39.
BLACK, Anthony. Popes and Councils. In. ALLMAND, Christopher (org). The new Cambridge Medieval History. Vol. 7. Cambridge University Press, 2008. p. 65 – 88.
WATT, J. A. The papacy. In. ABULAFIA, David (org). The new Cambridge Medieval History. Vol. 5. Cambridge University Press, 2008. p. 107 – 163.
Sobre a autora do verbete:
Júlia Brown Rodrigues Adorne é graduanda em História Bacharelado pela UFSM e faz parte do Grupo de História Medieval e Renascentista-Virtù.
E-mail: julia.adorne@hotmail.com
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/9633948747036591